A face ideológica do Brasil retratada nos resultados das eleições 2024
Na última postagem, acolhemos a classificação ideológica dos partidos feita pela Folha de São Paulo - https://folha.com/zyu5vhbf - e nos perguntamos em qual linha ideológica os 50% dos brasileiros mais pobres votariam nessas eleições. Em média, essas pessoas ganham até um salário-mínimo.
Diante da suposta relevância da desigualdade de renda para compreender o comportamento político das pessoas, consideramos importante a distinção entre direita e esquerda apresentada pelo G1: para a esquerda, as desigualdades são vistas como negativas e devem ser combatidas pela ação do Estado; para a direita, elas são reconhecidas como negativas, mas o caminho para superá-las depende do esforço individual, especialmente dos mais pobres. Claro que esse não é o discurso explícito da direita, mas é o sentido subjacente que suas políticas econômicas e sociais conferem ao desenvolvimento.
Com base nessa distinção, presumimos que um voto consciente apresentaria uma coerência entre o contexto socioeconômico do eleitor e o comportamento dos partidos em relação a essas demandas. Se essa hipótese fosse válida, esperaríamos uma preferência dos 50% mais pobres por governos mais à esquerda, dado que esses partidos propõem ao Estado a responsabilidade de mitigar as desigualdades.
Contudo, ao observar os resultados das eleições decididas no primeiro turno, vemos que o Brasil atual se posiciona predominantemente ao centro, de acordo com o mapa ideológico do GPS da Folha de São Paulo. Os partidos que mais se destacaram foram o PSD (presidido por Gilberto Kassab), o MDB (presidido por Baleia Rossi), e o PP (partido de Arthur Lira, presidido por Ciro Nogueira). Essa “face” representa o famoso “centrão”, um termo amplamente utilizado tanto em discussões sobre o orçamento secreto no governo Bolsonaro quanto sobre o orçamento pix no governo Lula. É algo a ser observado com preocupação.
Nas capitais, o retrato ideológico também está concentrado: em 11 delas, a eleição terminou no primeiro turno, e em 15, o segundo turno ainda definirá o vencedor. Nas capitais que já concluíram o pleito, a direita venceu em 5 cidades, o centro em outras 5, e a esquerda obteve vitória apenas em Recife. Nas capitais que vão ao segundo turno, o PL e o União Brasil somam 43% dos candidatos. O centro participa com 34%, e a esquerda, com 19%, o que significa que a esquerda estará em disputa em 6 das 15 cidades (40%).
Em uma leitura rápida, poderíamos afirmar o aumento do chamado voto dos “pobres de direita”. Mas precisamos profundar as análises, especialmente quando os dados forem totalmente divulgados pelo TSE, ao final do segundo turno. No entanto, podemos preliminarmente, identificar tendência de descolamento entre posição de vulnerabilidade de renda do eleitor e a realidade do voto. À primeira vista, isso pode indicar o aumento dos chamados “pobres de direita”. Contudo, se queremos fortalecer a sociedade civil, esse cenário nos impõe análises mais complexas sobre o processo decisório do eleitor. Inclui pensar, também, o comportamento dos partidos mais comprometidos com mudança social e os mecanismos de manipulação em massa que estão disseminados atualmente.
É hora de agir, pois uma sociedade civil forte é aquela que detém conhecimento sobre a sua realidade social e consegue refletir coerentemente sobre suas possibilidades e desafios para ampliação do bem-estar coletivo.